Escolas Cervejeiras

Escolas Cervejeiras

Uma breve reflexão pessoal.

Volta e meia nos vemos falando nos tipos das cervejas, se Ale ou Lager, se escola A ou B. Você já refletiu o que essas Escolas significam pra você? Quero compartilhar brevemente o que elas são pra mim. Alerta, não há certo ou errado, são minhas vivências e experimentadas e que em algumas vezes foi vivenciada in loco.

Alemã


Me remete drinkability, um lindo mass krug de 1 litro e cervejas de trigo. Tradição também, muita tradição no copo e ao redor. Aas fridas alemãs não estão assim por fantasia, elas usam vestidos coloridos, adornos nos cabelos e meias até os joelhos, ostentam as cervejas com ternura, e não estou falando ao servir, elas bebem.
Estive em 2016 no Sul da Alemanha para uma feira do setor. Conheci esse país sob a ótica da cerveja mas me impressionei com o todo. Se existe tradição na cerveja, os alemães estão com centenas de anos nos mostrando como ser. As cervejas na Alemanha estão sempre associadas aos alimentos, à cultura e à celebração. Já achei essa Escola muito simples, mas volto para as lagers sempre que estou buscando o conforto em uma cerveja. É o Estado da Arte na cerveja. Se admiramos essa bebida, devemos simplesmente reverenciar os Alemães.

Belga


Cervejas incríveis, tacas coloridas com bojo para aromas. Maior teor de Álcool e fenóis de levedura. Eles não serem “puro malte” deu a falsa impressão de inovação ou desrupção, mas na minha opinião não são inovadores, mas tudo bem pois não há nada de problema com isto. Qual estilo belga desenvolvido nos últimos 20 ou 50 anos? Posso estar distraído, mas não observei nenhum. É verdade que alemães e belgas se alfinetam por isto. O que eles pensam dos norte e sul americanos então é impublicável. Belgas são tradicionalistas tão quanto os Alemães. Uma escola que pode ter como ícone barris de madeira, mas apenas usados para agregar envelhecimento e ou acidez proveniente de leveduras selvagens por longos períodos. Mas quando você citar uma marca de cervejaria, invariavelmente fazem com que eu lembre do envase em garrafas, ora para também envelhecer ou ser servida de forma respeitosa para uma pessoa que saberá o valor do tempo. “O Tempo não respeita o que você faz sem ele”, frase que pode ser lida em um berço de barril na adega de madeira da cervejaria Cantillon, que respeitosamente também transcrevi em um berço de barril em Lauro Müller usando a mesma cor. Aliás também usamos uma onomatopeia em Lauro Müller, também trazendo à uma outra referência belga, A Duvel, que pregou na sua faixada “ssst… aqui se faz a Duvel” adaptando-a para “shhhh… aqui se faz a Carvoeira “ em um outdoor defronte da cervejaria. A expressão não é figurativa para uma imposição, mas sim um alento ao estilo enfermeira que sugestiona: “Shhhh cuidado, há um ambiente de repouso em que o tempo deve ser respeitado”. Os belgas são doces, usam muito açúcar nas cervejas e nos chocolates, somos o país da Cana-de-açúcar e fazemos cervejas “belgas” também muito bem. Visito a Bélgica nas garrafas que eu consumo, essa viagem esta na minha lista de desejos.

Inglesa


Ales maltadas e lupuladas, e maioria das vezes carbonatação levemente baixa. Aliás a expressão ALE é também tradução literal de cerveja na Inglaterra, além da própria expressão Beer. Fui 2 vezes para Londres e frequentei Public House (Pub) e visitei também cervejarias. São cervejas generosas em cores e sabores. O lifestyle de celebração e aglomeração é para mim mais óbvio, tanto que imagino o consumo majoritariamente em barris do que garrafas para eventualmente levar para casa para consumir sozinho. Novamente uma função importante atribuída aos Pubs. Os ingleses inventaram o futebol, já somos gratos o suficiente por isto, não devemos tornar esse diálogo mais longo, senão frustaremos uns aos outros.

Americana

É uma escola criada a partir das outras escolas, aliás muito bem fundamentada apesar disto. Vale lembrar que os dois guias de estilo mais usados no mundo todo são americanos, ambos surgidos a partir da metade da década de 80. As cervejas americanas já estavam lá muitas décadas antes, mas o reconhecimento só foi advindo com os próprios americanos os inscrevendo. Aliás Alemães e outros não reconhecem os institutos e quando há concursos cervejeiros na Europa, os organizadores europeus até criam um próprio guia no edital dos seus concursos.
Americanos então usam características locais e inovação movida à marketing muito bem aceito e fundamentado por storytelings. Aos ingredientes locais cabe ressaltar mais de 800 maltarias de diferentes tamanhos no país. O que dizer então de mais de 19 estados plantando lúpulos, com varietais ora adaptadas e ora criando novas espécies. Agora citando apenas um estilo bastante icônico para essa escola, criam em Regiões variações de Ipas com características de turbidez distintas, outrora corpo baixo ou alto de maltes, lúpulos frutados com adição em técnicas mais variadas, adição de frutas, maltes especiais criando cores e invariavelmente sabores distintos desmontando o atributo Pale do estilo, e a história não para.
Em grande maioria, o substantivo vira adjetivo no estilo, exemplos: American Pale Ale, American Barley Wine, American Blond Ale, American Wheat, American Stout/Imperial Stout, American Sour, American Brown Ale, American Porter, American Lager, American Amber, American Red, e o termo American segue para outros muitos estilos “adaptados”. São inovações que chamamos superficiais se fôssemos medir seguindo os conceitos do autor filandez Alf Rehn.
A escola americana de cerveja é linda e generosa em sua plenitude, usufrui de malte e lúpulos com imensa sabedoria, atribui acidez e envelhecimento em madeira também. A tradição é relativa, também pudera pois as Américas foram colonizadas a poucas centenas de anos, e adaptar-se é nosso exercício diário.

Novo Mundo

Essa “escola” não existe, mas em 2015 no material da inspiradora professora Cilene Saorin por ocasião do curso de Sommelieria da Doemens, esse anexo me fez repensar o que estamos desenvolvendo no presente. Países como Argentina que já possui 2 estilos catalogados com a Dorada Pampeana e a Ipa Argenta, Italia agregando a cultura das uvas, Japão e China fortes representantes asiáticos e que possuem cultura e gastronomia peculiares, Nova Zelândia com lúpulos distintos, e não menos citar o Brasil de dimensões continentais e que despertou para o mercado de cervejas como conhecemos apenas há alguns anos.
Fundamentando o Brasil, somos terceiros em consumo de cervejas, temos uma indústria de equipamentos para cervejarias bem desenvolvida, instituições de ensino já reconhecidos inclusive internacionalmente, cervejeiros brasileiros inquietos, disponibilidade de frutas e especiarias abundantes e com qualidade, mercado consumidor também ávido por inovações.
Vem aí um Brasil que não é autossuficiente em malte mas que começou beneficiar cevada em grãos maltados especiais. Não seremos autossuficientes em lúpulos, mas a cultura dele já mostrou ser apta, faltando agora escalar volume respeitando as características locais, revelando a tipicidade local que invariavelmente temos nos atributos sensoriais deles. Leveduras, essas estão abundantes e estão por aí esperando serem descobertas, já temos pesquisa e desenvolvimento e dentro de pouco tempo ouviremos muito sobre esses organismos incríveis. Frutas e especiarias, aos milhares, calda longa. Tudo isto já propiciou a Catharina Sour como um estilo e acredito que outros mais podem surgir, ao seu tempo. Um estilo de cerveja não se cria, ele se manifesta.

Já escrevi repetidas vezes os 4 pilares para o surgimento de uma cerveja candidata a virar estilo, mas pelo adiantado texto longo deste atual artigo, sugestiono a leitura em paralelo agora ou no futuro.

As Escolas Cervejeiras são importantes, minha percepção pessoal pode não representar o todo, e nem irá. Admiro cada qual com suas peculiaridades. Eu vejo o globo terrestre a partir daqui de uma forma diferente e o mapa da cerveja mundial vai ganhando novos vetores.

Aqui se eu pudesse, brindaria meu copo cheio de qualquer cerveja com você, sinta-se agraciado. Saúde e espero vê-lo em outro copo, ops, outro artigo.